segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Duas faces da mesma moeda


Quando adolescente, sempre me questionava até onde ia o poder cultural e massificador da cultura americana. Que Hollywood não tem concorrentes na questão de projeção cultural, isso me parece óbvio. Mas algo que sempre me intrigava era a visão única que predominavam nos filmes de guerra. Por isso sempre imaginei porque nenhum diretor e roteirista se interessaram em realizar o filme com um roteiro simples, tampouco original:

“ Era uma vez uma pequena japonesinha, vamos chamá-la de Yoko. Yoko era uma linda e delicada jovem da alta sociedade japonesa. Seus pais são atenciosos e lhe dão amor, mesmo que seja de seu jeito peculiar. Mas Yoko não se importa. No seu aniversário de 16 anos, Yoko se apaixona por Nakao, um pequeno e honrado agricultor. Florescida a paixão, o roteiro giraria em torno da luta dos dois amantes pelo seu amor. Juntos concebem um filho e decidem fugir para viver seu amor. Mas antes de fugir, Nakao é convocado a lutar na 2a Guerra. Mesmo relutante em deixar seu amor, Nakao serve com orgulho seu país. Yoko chora anos a fio na esperança de que Nakao volte vivo, o que realmente acontece, mas com um pequeno problema: Nakao volta com as pernas amputadas e deprimido. Yoko, que estava morando em uma pequena propriedade afastada com o filho de Nakao, sai à procura do mesmo para contar-lhe a respeito do filho. Após incessante e angustiante procura, ambos de reencontram e o amor floresce novamente. Nakao comove-se ao descobrir que tem um filho. Ambos se amam e prometem viver até o final da vida juntos. Infelizmente, no dia posterior o Japão é bombardeado e devastado. Nakao e Yoko morrem. Seu filho, hoje com 45 anos é quem nos conta a história, que só foi possível graças às cartas que Yoko escrevia. Mas o rapaz exibe seqüelas do desatre, sua pele é Albina e sem pelos e não raro o mesmo apresenta convulsões inexplicáveis, até hoje não explicadas pela ciência. Também não poderá ter filhos, e por isso decide criar um orfanato com o nome de Yoko e Nakao, além de tornar-se um respeitável estudioso em favor da Paz Mundial. O final o filme mostra o filho recebendo condecoração na ONU. O rapaz chora. Aparece uma frase de efeito em favor da paz. Sobem os letreiros com a música “Imagine” de John Lenonn ao fundo.Fim. “

Fácil, não?

Por isso tive a grata satisfação de assistir não a um, mas dois filmes de Clint Eastwood, meu rabugento favorito. Dois projetos de suma importância, dois filmes que tratam do mesmo tema e do mesmo acontecimento. A sangrenta batalha entre americanos e japoneses na ilha de Iwo Jima . O primeiro filme, A Conquista da Honra, mostra estes acontecimentos sob a ótica americana. Quando os americanos conquistam determinada área da ilha, não perdem a oportunidade de fincar a bandeira americana no solo japonês. Esta imagem foi fotografada e correu pela américa, elevando seus simplórios participantes ( que não eram os mesmos da primeira bandeira, e sim de uma segunda) a heróis da liberdade. Ou seja, ótimos garotos propaganda para angaria fundos para a guerra.

Já Cartas de Iwo Jima me parece mais ambicioso e mais intimista. A história narra o trabalho do general japon~es para defender a todo custo, ou ao menos retardar a derrota japonesa na ilha. Para isso, tem de enfrentar, além do maior poderio inimigo, a honra japonesa que não adimite outra punição para derrota que não a própria vida.

O grande trunfo destes filmes é mostrar que todos os fatos históricos, atuais ou não, dependem do ponto de vista do narrador. Se no primeiro nos deparamos com temerosos soldados americanos entrando em território desconhecido, do outro lado vemos os também temerosos japoneses com a aproximação do inimigo melhor preparado belicamente. Não há heróis, não há vilões, todos são humanos. Apesar do filme ainda criar alguns estereótipos, é formidável notarmos que é possível sim que qualuqer acontecimento tenha dois lados. Nós mesmos já fomos odiados e amados, e não somos melhores nem piores que outrem. Somos únicos, com nossa individualidade, costumes, acertos, erros, preconceitos. E isso o filme retrata muito bem.

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